A porta do ônibus se abriu com aquele
chiado característico, e meu pai desceu acompanhado do cobrador, que abriu o
compartimento de bagagens e de lá tirou uma caixa bem grande de papelão. Num
dos lados da embalagem, pude ler a palavra "Philips" e logo abaixo
desta, "TV", ambas escritas em letras azuis. Aquele primeiro aparelho
de televisão, ainda em preto e branco, significava que nossa família agora
contava com o que havia de mais avançado em termos de tecnologia. Abracei meu
pai e dei pulos de alegria. Estávamos em 1983.
Mal sabia eu, porém, que havia uma
grande distância entre ter uma TV e poder assistí-la. Para ser mais preciso,
cerca de 800 metros: esta foi a extensão da rede de fios que foi preciso
construir, instalando uma antena do tipo "espinha de peixe" no alto
do morro que ficava nas terras do vizinho. Nos primeiros meses foi uma beleza,
depois disso era o caos, bastava alguma chuvarada ou vendaval para que
ficássemos sem TV por vários dias, até que a rede pudesse ser consertada. Fora
a TV, eu podia contar na época com o bom e velho futebol no campinho de grama
rala, poucos jogos de tabuleiro e algumas revistinhas da Disney. Assim era o
lazer de então, inocente e despretensioso.
Hoje, passados mais de 30 anos, a febre
do momento atende pelo nome de Pokemon Go, um jogo nada inocente que se utiliza
da chamada realidade aumentada para
colocar monstrinhos virtuais misturados ao ambiente real que nos cerca, fazendo
com que os jogadores precisem se deslocar pelo terreno para assim poderem
capturar as criaturinhas. Até aí nada de muito espantoso, o que impressiona
mesmo é o apelo de massa do produto, que já conta com milhões de jogadores pelo
mundo, revelando o alto poder viciante da marca Pokemon e seus monstrinhos
esquisitões.
A procura pelo jogo é tão grande que
engloba todas as faixas etárias, literalmente dos 8 aos 80 anos, fazendo dele
num fenômeno nunca visto até hoje. Teve gente que faltou ao trabalho (e perdeu
o emprego) para caçar Pokemons. Pessoas tiveram seus celulares roubados na
calada da noite, sofreram acidentes graves como atropelamentos e até mesmo
morreram tentando pegar aquele bichinho virtual raro, para fazer inveja nos
amigos. Apesar de todas essas ocorrências, a febre continua em alta. O que
praticamente ninguém ainda se deu conta é que o game Pokemon Go é apenas o
comecinho do que está por vir, num futuro muito próximo.
O real e principal objetivo do jogo é
puramente comercial. Ao colocar um Pokemon raro em determinada loja, por
exemplo, será possível atrair multidões de jogadores para aquele local, fazendo
com que sejam eles mesmos "caçados" e intimados a consumirem este ou
aquele produto que esteja em oferta. Futuramente, ao invés de caçar Pokemons,
as pessoas irão usar seus celulares para caçar descontos em grandes
supermercados e shoppings, caçar prêmios e promoções no Natal, Dia das Mães,
Dia dos Namorados, etc. As possibilidades de aplicação da realidade aumentada
são praticamente infinitas. A imaginação é o limite.
Logo à frente o cinema e os filmes serão
coisa de museu. O público poderá participar do enredo junto com seus
personagens favoritos, interagindo com eles. Será possível cantar junto com seu
artista preferido e jogar futebol lado a lado com Neymar ou Cristiano Ronaldo,
tudo graças à realidade aumentada. Não será mais possível separar o mundo real
do virtual, uma coisa fará parte da outra, serão interdependentes. Se tantas e
tão drásticas mudanças são positivas ou negativas, ainda não sabemos, o que
sabemos é que esse é um caminho sem volta, a humanidade está redefinindo o
mundo em que vive, bem como a si mesma.
Um comentário:
Q merda hein!
L.Saldanha
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