Dentre todas as formas de vida que floresceram em nosso planeta, a mais
difícil de ser estudada e entendida é o ser humano. Nossas paixões, dilemas,
dúvidas e vícios não encontram paralelo nas outras espécies. Para o bem ou para
o mal, mais para o mal eu diria, somos únicos e inimitáveis. Certos padrões de
comportamento que apresentamos vão contra toda a lógica do que seria racional e
sensato biologicamente. Nesse quesito nada se compara a certos vícios que
cultivamos e alimentamos ad infinitum.
Analisemos por um momento a cultura do chimarrão.
Ainda nos anos
de 1500, os primeiros exploradores espanhóis chegaram até a foz do Rio
Paraguai, onde acabaram fundando a cidade de Assunción, hoje capital daquele
país. Lá, graças à convivência com os guaranis, indígenas que habitavam as
margens do rio, entraram em contato com um estranho chá de ervas muito amargo e
forte, que as tribos tinham o hábito de consumir, possivelmente há séculos. Com
o passar do tempo, o homem civilizado começou ele mesmo a transportar pelos
campos afora aquela xaropada de ervas, que foi se espalhando geograficamente,
ocupando o espaço que hoje vemos nos mapas e que abrange Argentina, Uruguai,
Paraguai e estados do sul do Brasil, onde o chá, hoje popularmente conhecido
por chimarrão, ganhou status de celebridade.
De sabor
amaríssimo, o chimarrão é servido muito quente, mesmo que esteja fazendo 40
graus à sombra e todos saibam que se sentiriam muito melhor bebendo uma bebida
gelada. As crianças, coitadas, mal saem das fraldas são logo apresentadas ao
chá amargo. As primeiras experiências não costumam ser nada agradáveis, devido
ao sabor forte e a grande quantidade de folhas trituradas que enche a boca,
causando desconforto e irritação das mucosas. Ainda que a população consuma e
idolatre o chamado mate amargo, é preciso que se diga: o chimarrão tem um sabor
horrível, intragável. Afora os aspectos práticos da bebida, existem ainda os
aspectos culturais. Não se sabe o porquê, talvez mesmo entre os indígenas já
fosse assim, o chimarrão é normalmente consumido em rodas de amigos ou
familiares. O consumo coletivo, com a cuia passando de mão em mão, propicia
enormemente a proliferação de bactérias e germes, mas ninguém se importa,
afinal a tradição fala mais alto e parece justificar tudo, estando acima
inclusive do bom senso.
Culturalmente
o chimarrão possui uma força quase impositiva, irrompendo imperiosamente entre
os mais jovens, que levam adiante o costume de consumir a bebida muito quente e
amarga. Nos momentos de lazer, nos passeios pelos parques e até durante as
compras de supermercado, é possível ver casais com seu “kit chimarrão” sempre a
tiracolo: jogadas num canto do carrinho de compras, lá estão as indefectíveis
cuia e garrafa térmica. Durante uma rápida caminhada no domingo de manhã ou à
tarde, é possível testemunhar cidadãos dirigindo com uma das mãos ao volante
enquanto a outra segura uma enorme cuia de chimarrão. Ah, tenha a santa
paciência! A impressão que causa aos que não cultuam a bebida é uma necessidade
enorme de fazer propaganda. O fator gostar talvez nem seja o que mais pesa, e
sim esse improvável status que a cuia conferiria ao seu portador, quase um
atestado de identidade e de masculinidade.
Em incontáveis
momentos de minha vida, bem que tentei entrar no clima e experimentar, fazer
parte dessa especie de irmandade, mas não teve jeito. Acredito que eu seja
muito contemporâneo para me render ao chimarrão. No frio intenso do inverno,
encontro satisfação mesmo é num bom café ou chocolate quente; no calor abrasador
do verão, qualquer bebida gelada serve: água, suco, refrigerante ou cerveja.
Com temperaturas tão altas como as que têm feito, beber água quente é algo que
nem me passa pela cabeça.
Um comentário:
Olá, Saldanha, tudo bem?
Estava lendo o seu post e decidi fazer algumas ressalvas. Sou paulistano praticante de esportes e psicólogo. Me habituei ao chimarrão há mais de dez anos e posso dizer por experiência que o hábito tráz benefícios que vão muito mais além dos que aquilo que focou, além do que, fez questão de enfatizar seu hábito por cerveja e refrigerante. Já que é professor, recomendo que, antes de dar sua opinião, verifique s estudos realizados e faça um balanço sobre os benefícios da erva e da cerveja ou refrigerante e, em um próximo post, critique o que realmente deve ser criticado e com o mínimo de embasamento. Segue abaixo um post coerente publicado por uma personal trainer que vai ao encontro da ciência e da coerência e não somente à opinião pessoal:
http://universovocesaude.com.br/chimarrao-um-tonico-natural/
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