O medo é a mais antiga de todas as emoções humanas. Muito
antes da descoberta da pólvora ou da criação de quaisquer armas de defesa
pessoal, o simples fato de sentirmos medo perante o desconhecido servia como
proteção à vida e dava alguma garantia quanto a nossa sobrevivência. Há uns 700
anos, devido às péssimas condições de vida em que se encontrava a grande
maioria da população mundial, todos tinham muitos motivos para sentir medo.
A ausência de energia elétrica fazia com que a vida humana
estivesse sempre a mercê de muitos perigos. Sem nenhuma forma de lazer para se
ocupar durante a noite, as pessoas iam dormir logo que escurecesse. Por volta
da meia noite ou pouco mais, já tinham tido várias horas de sono e era comum
ficarem insones por um longo período, em meio à escuridão absoluta. Por mais
que nos pareça estranho, era costume acordar e aproveitar a luz da lua para
caminhar até um vizinho e fazer-lhe uma visita. No contexto da época, a palavra
vizinho significava quilômetros de caminhada com estradas que mais pareciam
labirintos, animais ferozes rondando por ali, rios para atravessar e
assaltantes cruéis, que além de saquear gostavam de torturar, estuprar e matar.
Nessas situações, muitos morriam e só eram encontrados
no dia seguinte ou desapareciam para sempre, as mortes jamais explicadas.
Devorados por animais ou carregados pelas águas de algum rio ou enxurrada,
nunca mais eram vistos. A expectativa de vida era curta, ficando ao redor dos
trinta e poucos anos. Em condições precárias de moradia e higiene, passava-se
às vezes meses sem tomar banho. Com frequência, o corpo vivia infestado por
parasitas e doenças de pele causadas pela sujeira. Eram tempos muito difíceis.
Literalmente lutava-se pela vida, em meio a tantas adversidades e incertezas.
Na sociedade moderna, a humanidade experimenta tal
nível de qualidade de vida e de longevidade jamais vistos ou sequer imaginados.
O advento da energia elétrica trouxe para a nossa civilização invenções e
confortos aos quais na antiguidade nem as classes mais abastadas podiam
usufruir. As distâncias geográficas, sob muitos aspectos, encurtaram ou mesmo
desapareceram. Vivemos entre dois mundos distintos que estão sempre
interligados e trocando informações entre si: o mundo real da forma que o experimentamos
com nossos sentidos, e o mundo virtual, com o qual interagimos, mas não podemos
nos fazer presentes em carne e osso. Neste último, tal como no mundo antigo,
anterior à eletricidade, muitos são os perigos que nos esperam.
Espionagem, roubo de dados e senhas, invasão de
instituições governamentais e privadas, exposição de imagem pessoal. Quem troca
informações por meio do computador, seja por motivos de lazer, trabalho ou
estudos, está permanentemente exposto a estas ameaças. Embora existam opções
para se prevenir e evitar problemas, a maioria das pessoas nem sequer imagina que
sua vida pessoal e profissional possa ser devassada com tanta facilidade. Nas
estradas desconhecidas e labirínticas por onde circulam tantas informações,
predadores estão sempre de olho em tudo, protegidos pelo anonimato e pelo
conforto de suas casas, geralmente a milhares de quilômetros. Por mais banais ou desimportantes que nossas
atitudes possam parecer, nada passa despercebido.
O recente episódio envolvendo Carolina Dieckmann
exemplifica isso muito bem. Talvez cansada de tanto se ver maquiada e
super-produzida, a atriz quis se ver como realmente é. Foi traída pela vaidade
e curiosidade. Pelos caminhos tortuosos do mundo virtual, foi atacada e exposta
na sua intimidade. Uma vez que fotos e vídeos tenham caído na internet,
provavelmente estarão lá para sempre, à disposição de quem quiser vê-los.
Como nos tempos antigos, ainda sentimos medo. Ao que
parece, não importa o quanto a civilização humana se modifique, o medo estará
sempre conosco. Talvez com outras caras, outras roupagens, mas ainda assim incomodamente
onipresente.
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