
Durante uma crise diplomática entre Brasil e França, nos anos 60, o então presidente francês Charles de Gaulle teria feito a afirmação que aqui transformei no título desta coluna: “o Brasil não é um país sério”. Realmente, chega a impressionar que 50 anos depois, pelo que as evidências indicam, a situação continua tal e qual.
No domingo à noite, por volta das 19 horas, eu acompanhava a apuração destas eleições gerais, vendo os números pipocarem na tela do notebook, em tempo real, nos 27 estados que compõem a federação. À medida que o tempo passava e mais votos eram atualizados, pude notar que as previsões de que talvez o palhaço Tiririca chegasse a fazer um milhão de votos eram inverídicas. Não apenas chegou a esse número, como o ultrapassou enormemente, totalizando ao final assombrosos 1.353.820 votos.
Outro dia, ainda um pouco antes da eleição, um conhecido meu perguntava com certo ar de estranhamento: “o que leva uma pessoa a votar num cara como o Tiririca?!” Bem, se uma pessoa somente já nos parece absurdo, imaginemos bem mais de um milhão de pessoas! Não se consegue encontrar nenhuma explicação que possa soar convincente. No final da década de 50, o rinoceronte Cacareco chegou a receber cerca de 100.000 votos para vereador, pela cidade de São Paulo.
Claro, naquele contexto pode-se perfeitamente entender que se tratava de protesto mesmo, afinal um rinoceronte não seria diplomado vereador, muito menos compareceria às sessões da câmara! Com o palhaço Tiririca é muito diferente: não só foi catapultado à câmara federal, como ainda levou outros “ilustres” candidatos a tiracolo. Apesar de ser uma piada, esta é mais pra chorar do que pra rir. Resultado de um bem montado esquema de marketing, Tiririca foi projetado para fazer um número absurdo de votos. E fez.
Apesar de ter declarado um valor irrisório em bens, a campanha do candidato Tiririca era coisa grande. Pelas esquinas de toda a grande São Paulo, sósias dele, paramentados com as inconfundíveis roupas coloridas e peruca de cabelo escorrido, distribuíam santinhos e cantarolavam a “Florentina”. Milhares de tiriricas trabalhavam incansavelmente, fazendo a gente lembrar do vilão Coringa e seus muitos sósias. A vida imita a ficção.
E se fica difícil engolir a eleição do palhaço, o que se pode dizer da massiva votação de caras como Romário e Danrlei? A desinformação do povo sobre a política é assombrosa. O ato de votar tornou-se algo vazio, meio sem significado. Vota-se por votar, simplesmente, para “se livrar da obrigação”.
A ideia de que é preciso escolher quem nos representará, quem poderá melhor defender os desejos da população, parece ter se perdido há bastante tempo. Cansado de ouvir promessas vazias, o eleitor já não se dá ao trabalho de analisar, de pensar com seriedade, afinal pensar cansa! Muitas vezes vota-se em troca de favores, em troca de serviços, de dinheiro, ou mesmo de uma cesta básica.
Outro aspecto a se analisar sobre as eleições, de um modo geral, é que apesar das reclamações dos eleitores, de que “é preciso gente nova”, ou “votar em alguém diferente”, os candidatos que acabam encabeçando as listas dos eleitos, são formadas em sua maioria, sempre por velhos conhecidos. Sempre os mesmos, de novo. Chega a ser cômica até esta situação: um cara fantasiado de palhaço foi eleito, mas o povo, mesmo sem vestir fantasia, é que é o verdadeiro palhaço, e o Brasil, um grande circo. Charles de Gaulle tinha toda razão.
Um comentário:
Essa situação se transformou em um círculo vicioso e já ficou difícil saber o que é causa e o que é efeito em toda essa "palhaçada". Os biscoitos vendem mais porque são fresquinhos ou eles são fresquinhos porque vendem mais? O povo vota mal por estar cansado de políticos que sempre enganam povo, ou os políticos que sempre enganam o povo estão aí porque o povo vota mal?
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