Durante
minha infância e boa parte da adolescência, nunca consegui entender o motivo de
não se comer carne bovina, de porco ou de frango na "Sexta-feira
Santa", e sim peixes em geral. Nas aulinhas da catequese dominical, a
professora nos dizia que "não se podia comer carne de animais que têm
sangue, em respeito ao sofrimento de Cristo". Eu escutava aquilo em
silêncio e lembrava de ver meu pai limpando peixes às vezes e, ao serem
cortados pela faca ainda meio vivos, eles se debatiam em sofrimento e eu via que
saía muito sangue deles também. Alguma coisa estava errada...
Na
Bíblia Cristã não há nenhuma norma ou orientação no sentido de que se comam
somente peixes nesta época do ano. Então de onde teria se originado esta
prática?
Na verdade, foi somente ali pelo final do
século XV (1470 até 1480) que a Igreja Católica repentinamente instituiu que as
"carnes vermelhas" deveriam ser evitadas em respeito ao sofrimento do
Senhor e em sinal de humildade (pescados eram muito baratos nesta época, sendo
a base das refeições dos mais pobres). Ocorre que neste período a maior frota
de barcos pesqueiros de bacalhau e de outros pescados era de propriedade do
Vaticano, que monopolizava esse comércio. Como a pesca estivesse muito
abundante, os armazéns estavam abarrotados e era preciso encontrar uma forma de
vender todo o pescado excedente, uma vez que o peixe, mesmo salgado, tem um
período de validade relativamente curto.
Engenhosamente,
os padres declararam que a partir daquela data "seria grave pecado"
comer carnes vermelhas, devendo as pessoas durante o tempo da quaresma consumir
apenas pescados. O resultado foi excelente: os depósitos de pescados se
esvaziaram e, em contrapartida, os cofres do Vaticano se encheram. De dinheiro.
Uma jogada de mestre cujos resultados e fins mercantilistas permanece até hoje,
graças à lavagem cerebral promovida continuamente pela Igreja nos seus fiéis e
pelo apelo que a religião possui no imaginário popular.
Em
face de tudo isto, quem acaba sempre pagando o pato são os pobres dos peixes.
Sim, porque do ponto de vista biológico, um peixe sofre tanto quanto um boi,
galinha, porco ou qualquer outro animal, ao ser morto. Quando retirado de seu
ambiente natural, a água, e golpeado com paus ou facões, o animal sente
exatamente o que se imagina que ele sinta: sofrimento, dor e desespero ao ser
privado do oxigênio, elemento que só consegue retirar do ambiente aquático.
Nos
dias presentes, comer peixes na "Sexta-feira Santa" é mais do que uma
tradição, é uma obrigação. Ai de quem não o fizer! Corre-se o risco de "ir
pro inferno" sem escalas. Agir de forma mesquinha todos os outros dias do
ano, fazer maldades, ser dissimulado, falso, incitador de ódio etc, tudo isso é
permissível, afinal depois é só pedir perdão a deus que estará tudo bem. Ah,
quanto a comer um bom bife ou churrasco amanhã, não pode não viu, é pecado...
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