quarta-feira, 3 de agosto de 2011
É proibido proibir
Esta semana aconteceu o impensado: depois de mais de 25 anos, um filme tem proibida a sua exibição em todo o território nacional. A polêmica produção sérvia “Um filme sérvio-terror sem limites”, dirigido pelo estreante Srdjan Spasojevic, foi censurado em todas as salas de cinema do Brasil, depois que representes do DEM ingressaram com uma ação junto ao Ministério Público, alegando que a produção incitaria à violência e à pedofilia.
Com requintes de crueldade, o filme conta a história de um ator de filmes pornográficos já aposentado, que é convidado a participar de um último filme. Endividado, ele acaba aceitando, sem imaginar que durante as gravações acabará descendo ao próprio inferno de sua miserável existência, com consequencias que mudarão para sempre sua vida. Independentemente das cenas mostradas ou do tema que aborda, a proibição acaba abrindo uma brecha para a possível volta da censura no país, num futuro talvez não muito distante.
Ora, é preciso considerarmos que, dadas as circunstâncias, nada justifica tal proibição, uma vez que nem sequer se trata de exibição pública, como em um canal da TV aberta, por exemplo, em que praticamente todas as faixas etárias poderiam ter acesso ao conteúdo supostamente inapropriado. Seria muito mais sensato restringir, exibindo apenas nos cinemas e colocando classificação adulta, como no caso dos filmes pornográficos. Simples assim.
Para piorar a situação, nenhuma das pessoas responsáveis pela proibição sequer se dispôs a ver o filme. Provavelmente devem ter lido uma sinopse de uma meia dúzia de linhas na internet e, com base simplesmente nisso, decidiram proibir e pronto. Então sendo eu um adulto, cidadão que paga impostos, trabalhador, não tenho mais o livre arbítrio para decidir se quero ou não ver determinado filme?! Isso é de um absurdo sem limites. Faz-nos sentir novamente a sombra rapineira da censura pairando sobre nossas cabeças, tal como na hoje distante época do regime militar.
Vejo como um tremendo falso moralismo e hipocrisia querer banir um filme, como se ali residisse o que há de mais danoso para os cidadãos ou mesmo para o país. Com tantos problemas acontecendo, tanta violência, tanto dinheiro sendo desviado, licitações fraudulentas, superfaturamentos, rodovias federais que mais parecem um queijo suíço, aeroportos engasgados de gente... Com tudo isso e ainda mais, e se preocupam em proibir um filme. Proibir, porque se configura num “atentado aos bons costumes”, porque “fere” o Estatuto da Criança e do Adolescente...
Caso os magistrados do país queiram proibir algo, por que não “proíbem” a corrupção?! Por que não “proíbem” o analfabetismo de tantas crianças, jovens e adultos?! Por que não “proíbem” que pessoas morram na fila de espera do SUS, que pessoas morram de fome e de frio jogadas pelas calçadas de todo o país, ou que mães dêem a luz nas suas próprias casas ou nas calçadas sujas das ruas?!
Em nome de uma suposta moralidade (de cuecas), se tenta impedir que o povo tenha acesso a um filme corajoso e provocativo, que pode nos fazer refletir sobre alguns dos maiores tabus da história da humanidade. Sabe-se que a proibição atiça a curiosidade. Nesses tempos de globalização e de disseminação desenfreada da informação, com toda certeza pessoas que nem sequer ouviriam falar do filme, correrão e baixarão cópias para seus computadores, ávidos por querer assistir, afinal se é proibido é muito mais gostoso.
De minha parte, eu já tinha mesmo visto o filme e nem tinha ficado muito impressionado ou amedrontado. O que realmente assustou foi saber dessa notícia da proibição. O filme, por mais medonho que seja, é ficção. A censura é real, e assusta muito mais.
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