quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Doce amargo dos pampas?



Dentre todas as formas de vida que floresceram em nosso planeta, a mais difícil de ser estudada e entendida é o ser humano. Nossas paixões, dilemas, dúvidas e vícios não encontram paralelo nas outras espécies. Para o bem ou para o mal, mais para o mal eu diria, somos únicos e inimitáveis. Certos padrões de comportamento que apresentamos vão contra toda a lógica do que seria racional e sensato biologicamente. Nesse quesito nada se compara a certos vícios que cultivamos e alimentamos ad infinitum. Analisemos por um momento a cultura do chimarrão.
Ainda nos anos de 1500, os primeiros exploradores espanhóis chegaram até a foz do Rio Paraguai, onde acabaram fundando a cidade de Assunción, hoje capital daquele país. Lá, graças à convivência com os guaranis, indígenas que habitavam as margens do rio, entraram em contato com um estranho chá de ervas muito amargo e forte, que as tribos tinham o hábito de consumir, possivelmente há séculos. Com o passar do tempo, o homem civilizado começou ele mesmo a transportar pelos campos afora aquela xaropada de ervas, que foi se espalhando geograficamente, ocupando o espaço que hoje vemos nos mapas e que abrange Argentina, Uruguai, Paraguai e estados do sul do Brasil, onde o chá, hoje popularmente conhecido por chimarrão, ganhou status de celebridade.
De sabor amaríssimo, o chimarrão é servido muito quente, mesmo que esteja fazendo 40 graus à sombra e todos saibam que se sentiriam muito melhor bebendo uma bebida gelada. As crianças, coitadas, mal saem das fraldas são logo apresentadas ao chá amargo. As primeiras experiências não costumam ser nada agradáveis, devido ao sabor forte e a grande quantidade de folhas trituradas que enche a boca, causando desconforto e irritação das mucosas. Ainda que a população consuma e idolatre o chamado mate amargo, é preciso que se diga: o chimarrão tem um sabor horrível, intragável. Afora os aspectos práticos da bebida, existem ainda os aspectos culturais. Não se sabe o porquê, talvez mesmo entre os indígenas já fosse assim, o chimarrão é normalmente consumido em rodas de amigos ou familiares. O consumo coletivo, com a cuia passando de mão em mão, propicia enormemente a proliferação de bactérias e germes, mas ninguém se importa, afinal a tradição fala mais alto e parece justificar tudo, estando acima inclusive do bom senso.
Culturalmente o chimarrão possui uma força quase impositiva, irrompendo imperiosamente entre os mais jovens, que levam adiante o costume de consumir a bebida muito quente e amarga. Nos momentos de lazer, nos passeios pelos parques e até durante as compras de supermercado, é possível ver casais com seu “kit chimarrão” sempre a tiracolo: jogadas num canto do carrinho de compras, lá estão as indefectíveis cuia e garrafa térmica. Durante uma rápida caminhada no domingo de manhã ou à tarde, é possível testemunhar cidadãos dirigindo com uma das mãos ao volante enquanto a outra segura uma enorme cuia de chimarrão. Ah, tenha a santa paciência! A impressão que causa aos que não cultuam a bebida é uma necessidade enorme de fazer propaganda. O fator gostar talvez nem seja o que mais pesa, e sim esse improvável status que a cuia conferiria ao seu portador, quase um atestado de identidade e de masculinidade.
Em incontáveis momentos de minha vida, bem que tentei entrar no clima e experimentar, fazer parte dessa especie de irmandade, mas não teve jeito. Acredito que eu seja muito contemporâneo para me render ao chimarrão. No frio intenso do inverno, encontro satisfação mesmo é num bom café ou chocolate quente; no calor abrasador do verão, qualquer bebida gelada serve: água, suco, refrigerante ou cerveja. Com temperaturas tão altas como as que têm feito, beber água quente é algo que nem me passa pela cabeça.

Um comentário:

Santiago Gomes disse...

Olá, Saldanha, tudo bem?
Estava lendo o seu post e decidi fazer algumas ressalvas. Sou paulistano praticante de esportes e psicólogo. Me habituei ao chimarrão há mais de dez anos e posso dizer por experiência que o hábito tráz benefícios que vão muito mais além dos que aquilo que focou, além do que, fez questão de enfatizar seu hábito por cerveja e refrigerante. Já que é professor, recomendo que, antes de dar sua opinião, verifique s estudos realizados e faça um balanço sobre os benefícios da erva e da cerveja ou refrigerante e, em um próximo post, critique o que realmente deve ser criticado e com o mínimo de embasamento. Segue abaixo um post coerente publicado por uma personal trainer que vai ao encontro da ciência e da coerência e não somente à opinião pessoal:
http://universovocesaude.com.br/chimarrao-um-tonico-natural/